Poesia para surpreender

A Revista literatura contemporânea brasileira selecionou dez poetas brasileiros, uma escolha criteriosa da incalculável safra de jovens escritores que você precisa conhecer!

Confira abaixo uma lista incrível destes surpreendentes poetas e algumas de suas poesias. 


EPÍGRAFE 
Ana Martins Marques, O livro das semelhanças


Octavio Paz escreveu:
"A palavra pão, tocada pela palavra dia,
torna-se efetivamente um astro; 
e o sol,
por sua vez, torna-se alimento
luminoso"Paul de Man escreveu:
"Ninguém em seu perfeito juízo ficará à espera
de que as uvas em sua videira amadureçam
sob a luminosidadeda palavra dia"


Conquista
André Setti, no livro "Teatro das horas". São Paulo: Edições K, 2005


O fogo, no fundo do mar,
dançava manhoso
com as águas.
Estas, por terem visto
apenas pedras e peixes,
cederam.


Nos dias de chuva fina
Annita Costa Malufe, em "Fundos para dia de chuva". Rio de Janeiro: 7Letras, 2004


Cabe ficar desfiando lembranças opacas
Dessas meio disformes
Com cara de ano trinta
Ficar divagando nas veias da madeira
Da velha escrivaninha do avô
E pensando se o amor
Vai além de
Nomes
Números
E essa longa espera
Insone


Sobre o amor
Bráulio Bessa, no livro "Poesia Com Rapadura" (2017)


Ninguém pode escolher a quem se ama
é o amor quem lhe escolhe e diz vá lá
não existe uma regra certa pra se amar
Deus que escreve e que dirige toda trama
um roteiro escrito com comédia e drama
e ninguém sabe como o filme vai findar
não se avexe, deixe o amor lhe carregar
pois se existe um fato que eu acredito
É que na vida todo amor é bonito
feio mesmo, é viver e não amar!


Fabrício Carpinejar

No livro "Biografia de uma árvore". 2002


A chuva é a única chama
que caminha contra o vento.
Refaço seu lastro
com a insônia dos sapatos.

Enlouqueço de ternura,
indeciso entre o furor e o fulgor.
Desperto amarrado em alguma estrela,
servindo de referência
para o alinhamento das esferas.


Noturno
Felipe Stefani, em "Cultuar (blog)", 2010


Nos estreitos breves a arte íngreme
de ser,
frente as faces do mundo.
A margens se re-dobram nas entranhas das luas.
As barcas sonham a distância das flautas.
Fendido ao tempo feito
um canal,
nos orifícios cegos do fôlego,
basta aquilo que arrefece.
A inocência do mar submerge as cítaras.


João Doederlein


Você viu de perto a minha ansiedade.
E nem teve medo.
Eu que tive medo.
Tive medo porque ela rouba tudo o que me faz bem.
Medo porque a ansiedade que mora em mim
sou eu também.
Medo porque ela acelera o caos que existe
na minha cabeça.
Medo de que tudo que ela toque
apodreça. 

Andaluz

Mariana Ianelli, em "Duas chagas". São Paulo: Iluminuras, 2001


Vaga pela terra, filho trágico,
com as tuas duas mãos livres.
Furta o colo das putas,
escuta o ventre delas exausto.
O retorno sempre admirável de Sarah
te conduziria àquela velha madrugada de amplidão.
Mas afasta esta necessidade, filho. 
Quem uma vez mudou seus sinais correspondentes não voltará de pronto.
Nenhuma reparação, não há nada.
No mundo, cotidianamente, andarás sem teu coração.
Por cinco anos andarás, cismando com tuas faltas.
É preciso que seja assim.


A HORA
Nara Rúbia Ribeiro, do livro "Não Borboletarás", Editora Kelps, 2013


A porta do tempo é opaca,
mas menino a viu entre
aberta.
Foi espiar."- Mãe, cada minuto é feito de sessenta borboletas coloridas
Que voam depressa pra todo lugar.
"A mãe sorriu."- E qual a estrutura da hora, filho?"
"- A hora, mãe, é quando a matemática das borboletas se junta
E elas seguram as asas umas das outras,
cirandadas,
Como se fosse a humanidade inteira... 
"A humanidade inteira,
Essa é a hora.


Acalanto
Narlan Matos, em "Senhoras e senhores: o amanhecer!" (1997)


Há que alimentar a inocência de criança
E embalar a ternura, a criatura, a esperança
Há para o sonho não morrer
É preciso dormir para sonhar
É preciso sonhar para viver
Há tantas crianças dormindo
Ainda
É alta madrugada
Lá fora faz tanto frio
Psiu !!!
Não falem tão alto
Quando despertarem não adormecerão jamais como agora



A arte como respiro

Ainda não é possível calcular com precisão todos os impactos causados pela pandemia no mundo das artes, mas podemos afirmar que toda a cadeia produtiva foi duramente afetada, desde os artistas até os profissionais de apoio operacional, técnico e de gerenciamento e difusão.

Segundo André Luiz Pereira, profissional especializado em 'marketing' cultural há mais de 10 anos, a pandemia fez com que ele buscasse outras oportunidades, já que sua principal função, era até então, a de divulgador de eventos culturais.

A alternativa encontrada por André foi a criação de conteúdo para a área de comunicação, ministrando 'workshop' para jovens recém-formados em cursos de graduação. André buscou outros caminhos, mas ele é uma exceção, com a crise intensificada muitas agencias fecharam e os autônomos buscaram recolocação no mercado de trabalho.

Sem dúvida, os mais prejudicados foram os profissionais de apoio, com pouca ou nenhuma especialização, como, por exemplo: os carregadores de cargas de sonorização e iluminação, montagem de estruturas metálicas para grandes concertos, fechamentos, construção de tendas, etc, para esses trabalhadores existiram pouquíssimas alternativas.

Os artistas puderam participar de projetos, com cachês viabilizados por editais públicos e privados ou através de financiamentos coletivos, entregando as famosas "lives". Entretanto, as equipes técnicas que acompanham artistas também foram fortemente afetadas.

Sem dúvida, a maioria de nós só conseguiu manter a sanidade mental graças às centenas de projetos artísticos produzidos, nunca na história, a arte foi tão necessária.

A jornalista Yasmin Abdallah fez uma referência interessante sobre a necessidade de cuidarmos da mente - matéria veiculada no site da SP-ARTE.

"Além da preocupação em manter a integridade física - individual e comunitária -, outra questão surge em tempos de pandemia mundial: como garantir uma mente sã durante a quarentena? A livre expressão dos sentimentos e do inconsciente por meio das práticas artísticas e corporais pode fazer parte da solução.

Pelo menos foi o que descobriu a psiquiatra e terapeuta Nise da Silveira em meados dos anos 1940. Única mulher em sua turma de medicina na Faculdade da Bahia, a alagoana foi precursora no uso de atividades artísticas e musicais como método de tratamento psiquiátrico.

Yasmin relembrou as técnicas cruéis utilizadas em pacientes com distúrbios mentais sérios como esquizofrenia, como: eletrochoques e cirurgias cerebrais.

Ao começar a trabalhar no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II (atual Instituto Municipal Nise da Silveira), a médica recusou-se a aplicar tratamentos desse tipo e, foi transferida para um setor até então sem prestígio dentro do hospital: o da terapia ocupacional.

Seu trabalho envolvendo práticas artísticas revolucionou a área e, em 1946, Nise fundou oficialmente a Seção de Terapêutica Ocupacional, no Engenho de Dentro.

A arte salva, cura e traz benefícios incalculáveis, precisamos todos, como cidadãos, defender as políticas públicas e um olhar mais atento e generoso para a área que se mostrou essencial nestes quase dois anos de incertezas.

© 2019 Revista literatura contemporânea brasileira. Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Webnode
Crie seu site grátis! Este site foi criado com Webnode. Crie um grátis para você também! Comece agora